E, por mais que seja dura,
A palavra não cura.
Há solidão na noite escura.
Cego de paixão, o coração procura
O tempo, leve em culpa, em loucura
Que em lágrimas frias perdura
Como um manto, uma armadura.
Inerte, como o olhar de uma escultura
E, como mármore, duro em brancura,
Perece o sentimento em clausura.
Pálido, como uma morta criatura.
Venerável, de vulnerável estrutura.
Ao sol, mantém a postura
À espera da brisa, a frescura.
E, num lampejo tempeste, fissura.
E jaz a lembrança que à água se mistura.
De que valeu a aventura?
Perdido na releitura de uma rasura,
De um poema inacabado, sem tessitura.
Rascunho de uma vida nunca à altura.
Restou ternura?
Vale remendar um coração em sutura?
Ou pôr-se-á à espera de outra ruptura?
Muda o contexto, mas não a conjuntura.
Já não resta sequer doçura.
Foi-se o sabor do amor em fartura.
Agora resta a consciência que mensura
Se foi cativa da sua ditadura.
Pois és fonte de amargura.
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